O sentido da vida
"O homem pode suportar tudo, menos a falta de sentido". Há de se compreender a força dessa afirmação quando vinda de um homem como Viktor Frankl. Psiquiatra, neurologista, judeu: sobreviveu três anos nos campos de concentração nazistas, incluindo Auschwitz. Perdeu o pai, a mãe, o irmão, a esposa e o filho, que não tiveram a mesma sorte. Essa experiência poderia tê-lo transformado em um homem cheio de rancor, amargura e melancolia. Mas ele decidiu emergir dela carregando o que eu pessoalmente considero a mais bela mensagem de esperança do século XX - um século que tudo fez para extinguir o valor da consciência humana, reduzindo-a a um subproduto de causas neurológicas, sociais, linguísticas. Frankl nadou contra a correnteza, apostando no azarão do páreo filosófico de seu tempo: a existência do sentido da vida - fenômeno desprezado por psicanalistas, behavioristas, marxistas, positivistas, niilistas, enfim, por todo um séquito de cegos que até hoje guiam outros cegos para o abismo do absurdo. Frankl venceu, praticamente sozinho. Desde suas primeiras publicações, as premissas teóricas e filosóficas da sua Logoterapia foram amplamente comprovadas em centenas de estudos empíricos pelo mundo: ter um sentido para a vida evidencia-se como preditor para a saúde física, longevidade, bem-estar, qualidade de vida; enquanto que a ausência de sentido está associada com maiores índices de depressão, suicídio, abuso de substâncias, entre outros (Damásio, Melo & Silva, 2013).
Hoje, os princípios de sua logoterapia são amplamente utilizados até mesmo por diferentes abordagens terapêuticas, pois foram reconhecidos como os únicos possíveis para a compreensão daqueles casos em que o ser humano não é afetado pela desregulação de neurotransmissores, por crenças disfuncionais ou por fantasias sexuais reprimidas, mas pela realidade existencial imposta pela vida. Pois o sentido da vida é uma realidade ontológica, e não uma criação cultural. É inútil tentar provar sua existência, pois não se trata de fenômeno uniforme, válido para todos. Ele simplesmente se impõe, para cada um de uma forma diferente, em uma situação diferente. E Frankl encontrou seu sentido justamente no sofrimento - no mais absoluto sofrimento - e fez questão de viver para transmitir esta mensagem:
"Um pensamento me traspassou: pela primeira vez em minha vida enxerguei a verdade tal como fora cantada por tantos poetas, proclamada como verdade derradeira por tantos pensadores. A verdade de que o amor é o derradeiro e mais alto objetivo a que o homem pode aspirar. Então captei o sentido do maior segredo que a poesia humana e o pensamento humano têm a transmitir: a salvação do homem é através do amor e no amor. Compreendi como um homem a quem nada foi deixado neste mundo pode ainda conhecer a bem-aventurança, ainda que seja apenas por um breve momento, na contemplação da sua amada. Numa condição de profunda desolação, quando um homem não pode mais se expressar em ação positiva, quando sua única realização pode consistir em suportar seus sofrimentos da maneira correta - de uma maneira honrada -, em tal condição o homem pode, através da contemplação amorosa da imagem que ele traz de sua amada, encontrar a plenitude. Pela primeira vez em minha vida, eu era capaz de compreender as palavras: 'Os anjos estão imersos na perpétua contemplação de uma glória infinita'." (Frankl, 1946/2004).
Referências:
Damásio, B. F., Melo, R. L. P., & Silva, J. P. (2013). Meaning in lifre, Psychological well-being and quality of life in teachers. Paideia, 23(54), 73-82.
Frankl, V. E. (2004). Em busca de sentido: Um psicólogo no campo de concentração. Petrópolis, RJ: Vozes. (Original publicado em 1946).