O que é orientação vocacional?
Tradicionalmente, a prática da orientação, adjetivada com o termo vocacional ou profissional, tinha por objetivo auxiliar os indivíduos a avaliarem o seu repertório comportamental e traduzi-lo em escolhas profissionais. Para isso, o orientador auxiliava o orientando a identificar opções de carreira adequadas, através da aplicação da clássica tríade de Parsons (1909/2005) que consiste, resumidamente, em (1) a compreensão de si mesmo, através da clarificação de aptidões, habilidades e interesses; (2) a exploração de áreas ocupacionais congruentes; e (3) a especificação das alternativas profissionais apropriadas, resultante das relações entre os dois primeiros grupos de fatores. Assim, na pretensão de traduzir autoconceitos para títulos ocupacionais, fazia-se uso principalmente dos famosos “testes vocacionais”, cujo resultado sugeria uma ou mais profissões adequadas para o perfil do testado.
Apesar de o modelo tradicional ainda ser bastante comum, a ideia de que existem testes que lhe darão a “resposta certa” a respeito de qual profissão ou área você deve seguir não é adequada à sociedade contemporânea. Por quê? Em primeiro lugar, porque esses testes pressupunham a existência de um autoconceito bem estabelecido, ou seja, presumia-se que o jovem já havia respondido de modo confiante e coerente a perguntas como “Quem sou eu?” e “O que eu quero?”. Tais perguntas, porém, são muito mais complexas hoje do que na sociedade industrial da primeira metade do século XX. O presente mundo do trabalho é menos estável, as profissões são mais dinâmicas e são oferecidas mais opções de caminhos a serem seguidos. Em segundo lugar, porque estamos vivendo um período de progresso exponencial da tecnologia, progresso este que vem colocando em constante xeque as noções tradicionais de carreira (e.g., Frey & Osborne, 2017). E, ao mesmo tempo, as tradições que outrora pautavam os valores da sociedade se enfraquecem continuamente, deixando muitos jovens confusos diante de valores de vida que se inflacionam e desinflacionam constantemente (La Taille, 2009).
Diante disso, a escolha de carreira com que se depara um adolescente do Ensino Médio nunca foi tão complexa. A orientação vocacional atual busca, portanto, auxiliar o jovem no processo de cristalização de um autoconceito e de uma perspectiva de carreira subjetiva (Savickas, 2004), levando em conta a complexidade do mundo atual. Com base em evidências científicas, os orientadores fazem uso de técnicas e modelos que já se provaram efetivos no auxílio de jovens em processo de elaboração de seus projetos de vida (e.g., Whiston, Li, Mitts & Wright, 2017).
Referências
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Frey, C. B. & Osborne, M. A. (2017). The future of employment: how susceptible are Jobs to computerisation? Technological Forecasting and Social Change, 114, 254-280.
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La Taille, Y de. (2009). Formação ética: Do tédio ao respeito de si. Porto Alegre: Artmed.
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Parsons, F. (2005). Choosing a vocation. Boston: Houghton Mifflin. (Original publicado em 1909).
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Savickas, M. L. (2004). Um modelo para a avaliação de carreira. Em Leitão, Lígia Mexia. Avaliação Psicológica em orientação escolar e profissional. Coimbra: Quarteto, 21-42.
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Whiston, S. C., Li, Y., Mitts, N. G., & Wright, L. (2017). Effectiveness of career choice interventions: a meta-analytic replication and extension. Journal of Vocational Behavior, 100, 175-184.
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Fredericko Wichmann é Bacharel em Psicologia pela Universidade Federal de Ciências da Saúde de Porto Alegre (UFCSPA), Mestre em Psicologia do Desenvolvimento pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), Bacharelando em Filosofia pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), Analista Comportamental pela Assessment Tools International (ATI) e Professional Coach pela Sociedade Latino Americana de Coaching (SLAC). Possui experiência com atendimento e pesquisa nas áreas de Orientação Profissional e Aconselhamento de Carreira, atuando no Serviço de Orientação Profissional (UFRGS), no Núcleo de Apoio ao Estudante (UFRGS) e em consultório particular.